publicado originalmente em 2019
Como seres humanos, às vezes nos sentimos moles por dentro, já se sentiu assim? Ficamos tão mexidos e mudados com certas situações, que parece quando o ortodontista ajusta o aparelho, dói pra caramba e parece que tá tudo mole e mudando de lugar. Ok, não sei se foi uma comparação lá muito feliz, mas hoje em dia, há tanta demanda para mudanças profundas (e muito necessárias) na forma como vemos e vivemos o mundo, que nós, pessoas e organizações, ficamos perdidos sem saber como agir.
Empoderamento feminino, direitos das minorias étnicas, novo papel do homem[i], masculinidade, feminilidade, rosa ou azul…afff…tem sido uma loucura planejar estratégias e campanhas de comunicação com demandas tão importantes quanto distintas. Marcas, produtos e serviços esforçam-se para definir a melhor abordagem comunicacional e adequar-se aos tempos que vivemos hoje mas, talvez estejam se esforçando demais!
Para evitar mal entendido, acredito que todos estes assuntos sejam imensamente relevantes e sejam a expressão de um momento de mudança profunda em nosso comportamento como humanidade ok?! Mas, ainda assim, muitas tentativas de posicionamento de marcas, produtos e serviços têm sido mal empregadas resultando em campanhas forçadas, deslocadas dos valores percebidos de marca e não condizentes com aquilo que a empresa é na realidade.
Coerência, alinhamento entre a comunicação e os valores essenciais da marca, clareza na comunicação mas, sobretudo, concretização ou tangibilização daquilo que a organização, marca, produto ou serviço realmente É. Muitas organizações adotam estratégias de comunicação baseadas nos anseios do momento, nas discussões que têm envolvido o consumidor, tomam partido mas, são percebidas de forma totalmente diferente pelos seus públicos de interesse, criando uma situação contraditória e que favorece a dissociação entre os valores comunicados e aqueles efetivamente praticados no cotidiano das atividades organizacionais.
Como remediar isso? Claro que as empresas não podem deixar de se posicionar caso sejam questionadas, e também fica claro que não é possível esquivar-se ou omitir-se, mas o alinhamento da comunicação só ocorrerá quando forem tomadas medidas concretas para que os valores estejam alinhados com a pratica cotidiana.
Os valores incluem diversidade de gênero mas o percentual de mulheres na organização em cargos de chefia é mínimo. Os valores incluem respeito às diversas deficiências mas a empresa, suas filiais e pontos de venda não são acessíveis, e não há programa de atração, capacitação e retenção destes profissionais. Os valores incluem respeito à diversidade sexual mas a organização só tem banheiros femininos e masculinos. Os valores incluem respeito ao meio ambiente mas a empresa causa um desastre ambiental e se esquiva de suas responsabilidades de forma ostensiva. É neste sentido que defendemos o alinhamento da comunicação, explicitando que as ações concretas devem, necessariamente, vir antes das ações de comunicação.
Adianta pouco a campanha publicitária que se posiciona de acordo com as demandas dos novos tempos quando a empresa ainda é altamente hierarquizada, machista, inacessível, e o processo seletivo para novos colaboradores exige foto e identificação de gênero no curriculum. Pode ser que esta disparidade não seja percebida imediatamente pelos públicos de interesse mas, com certeza, o desalinhamento entre discurso e prática será percebido e aí…o dano nem sempre é facilmente reversível.
[i] Confira as seis campanhas que revisam o conceito de masculinidade, no site do meio e mensagem, disponível em http://www.meioemensagem.com.br/home/comunicacao/2019/01/18/seis-campanhas-que-revisam-os-conceitos-de-masculinidade.html acesso em janeiro de 2019.