A propaganda e o empoderamento feminino

publicação original de setembro de 2019

O princípio da construção da identidade organizacional sustentável, tratado por Migliori (2009)[i] em artigo, explicita que a comunicação organizacional realmente sustentável e responsável, busca o alinhamento e o equilíbrio entre as dimensões ética, competente e responsável.

Aquilo que a organização afirma ser (dimensão ética), expresso pelos seus valores e comunicado extensivamente através dos meios de comunicação on e off line; Deve alinhar-se com o que a empresa pratica (dimensão competente), através de suas políticas internas, atividades e ações cotidianas e, por fim, alinhar-se com a percepção que os diversos públicos têm sobre ela (dimensão responsável). O que vemos no dia-a-dia é um distanciamento enorme entre discurso e prática.

Em 2018, diversas campanhas ganharam destaque tratando do empoderamento feminino, dentre elas, a marca Always com a campanha #likeagirl[ii], as campanhas pela real beleza da marca Dove, e, mais recentemente (2019) a campanha da Nike chamou a atenção pela força e receptividade na campanha  #dreamcrazier[iii]. Todas as campanhas com forte apelo com relação à valorização da mulher e de suas potencialidades, o que já representa uma conquista de espaço e uma mudança de mindset.

No entanto, embora o assunto esteja na moda e seja, hoje, politicamente correto ter esta postura, será que a prática tem acompanhado o discurso?

Em artigo de 2016 na Gazeta do Povo[iv], Meinhard afirma “Segundo pesquisa do IBGE de 2014, as mulheres ganham em média 24,8% menos que os homens em cargos similares. De acordo com a Grant Thornton International Business, no Brasil, as mulheres ocupam 19% dos cargos de alto escalão enquanto a média mundial é 24%”.

Em outro artigo, Roy (2018)[v] para a Revista Forbes, destaca que alcançar a equidade de gênero, no ritmo atual, nos exigiria 217 anos. Entre as 500 maiores empresas no ranking Fortune 500, apenas 26 CEOs são mulheres. O artigo cita ainda que os homens são promovidos 21% mais que as mulheres e apenas 38% das empresas no estudo “2018 Women in the Workplace” têm metas de representatividade de gênero.

Lessa (2018), em artigo para o Jornal Meio & Mensagem, destacou que a representação da mulher de verdade na propaganda somente vai ocorrer quando houverem mais mulheres em criação, na data, o percentual de mulheres na área, no Brasil, era de menos de 20%. Se considerarmos mulheres em cargos de liderança, não chegava a 6%[vi].

Na época (2015), o movimento More Grls[vii] tinha a meta de alcançar 50% de mulheres em criação até 2020. Em janeiro de 2019, nova pesquisa apontou que as mulheres somavam cerca de 26%[viii] do total, sendo 14% em cargos de liderança. O que mostra um avanço, embora insuficiente.

Sou educadora, por isso, talvez com certa miopia em virtude de minha paixão por educação, arrisco a dizer que tudo começa com a educação, na tenra infância. Desconfio muito de discursos enfeitados de empoderamento feminino como temos visto, embora concorde que a propaganda contribui muito para a mudança de mentalidade das pessoas em geral, que ela tenha a sua responsabilidade social, etc e tal. Mas, na avaliação cotidiana, no concreto das ações, a distância entre discurso e prática é imensa.

Não haverá empoderamento feminino real enquanto as ações forem externas, enquanto vierem de campanhas bonitas, discursos bem elaborados e artigos como esse, por exemplo. O verdadeiro empoderamento começa na barriga, na educação da pessoa mulher, no que se fala e se realiza dentro de casa, nas escolas e no ambiente de trabalho.

Porque o verdadeiro empoderamento vem de dentro e, como diz Rubem Alves, só a educação tem o poder de despertar a força que dorme dentro da gente.


[i][i] Migliori, Regina. Comunicação sustentável e redes de relações. Disponível em https://pt.slideshare.net/NosdaComunicacao/comunicacao-sustentvel-e-rede-de-relaes acesso em abril de 2018.

[ii] Always, #likeagirl. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=XjJQBjWYDTs acesso em abril de 2018.

[iii] Nike. Dream Crazier. Disponível https://www.youtube.com/watch?v=65iG4Pg31WU acesso em abril de 2018.

i do Povo.  2016. Disponível em https://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/artigos/equidade-de-genero-no-ambiente-corporativo-ainda-ha-muito-a-ser-feito-9qd81a4xae70me1297htou7il/ acesso em abril de 2019.

[v] Roy, Katica. Qual a importância da equidade de gêneros no universo CEO. 20 de dezembro de 2018. In Forbes. Disponível em https://forbes.uol.com.br/carreira/2018/12/qual-a-importancia-da-equidade-de-generos-no-universo-ceo/ acesso em abril de 2019.

[vi] Lessa, Isabella.  Mulher real na propaganda, só com mulher na criação. In Jornal Meio & Mensagem. 23 de maio de 2018  Disponível em https://www.meioemensagem.com.br/home/comunicacao/2018/05/23/mulher-real-na-propaganda-so-com-mulher-na-criacao.html acesso em abril de 2019.

[vii] More Grls. Disponível em http://moregrls.com.br/#

[viii] Lemos, Alexandre Zaghi. Lessa, Isabella. Três anos depois, mulheres são 26% na criação. In Jornal Meio & Mensagem. 21 de janeiro de 2019. Disponível em https://www.meioemensagem.com.br/home/comunicacao/2019/01/21/dois-anos-depois-mulheres-sao-26-na-criacao.html acesso em abril de 2019.

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